quarta-feira, 23 de maio de 2007

Animais fluorescentes? usando GFP


O interesse pela fluorescência não é exclusivo de criancas ou daqueles com uma mente mais inventiva. Mais do que um brinquedo, a fluorescência pode ser de grande utilidade para a ciência.

De facto, uma das ferramentas científicas mais úteis desenvolvidas nos ultimos anos foi a chamada GFP (green fluorescent protein) ou em português, a proteína verde fluorescente.

A história da GFP começou em 1961 quando os cientistas Osamu Shimomura and Frank Johnson trabalhavam na alforreca Aequorea victoria. Basicamente estes dois cientistas descobriram que existia uma proteína nesta alforreca que utilizava sinais luminosos dependentes em cálcio na produção da cor verde fluorescente característica da espécie. Para além de fazer as alforrecas brilhar com uma cor engraçada, a utilidade imediata desta proteína não foi imediatamente compreendida. Foi só bastante mais tarde, após 1992, que a GFP começou a ter uma função essencial em ciência...

A GFP é utilizada em ciência basicamente para indicar se um gene introduzido num organismo foi transferido para o núcleo da nova célula e está a ser expresso normalmente. Vejamos: Como vimos na semana passada, no programa sobre plantas transgénicas, muitas vezes os cientistas estão interessados em introduzir genes em novas células ou organismos. Mas como saber se o novo gene foi introduzido correctamente, e que a proteína correspondente esta a ser produzida? Bem basicamente os cientistas introduzem o gene de interesse e o gene de GFP. Se o gene de interesse tiver sido introduzido com sucesso, então também GFP será introduzido com sucesso, e as células ou organismo de introdução irá apresentar uma característica cor verde fluorescente...

E não só! É também possível associar a nossa proteína de interesse com GFP e monitorizar o seu movimento dentro de uma célula viva!

E a grande vantagem da GFP é que não só é fluorescente e pequena, como não possui quaisquer efeitos negativos na célula de introdução...


Mas agora passando a questões mais interessantes... Será que é possível utilizar GFP na criação de algo mais interessante, para além das suas óbvias vantagens para cientistas e investigadores?

Bem, acontece que já alguém teve ideias semelhantes. Desde que a GFP comecou a ser utilizada rutineiramente em ciencia que uma lista interessante de organismos fluorescentes tem sido criada... ou dizendo de outra maneira, os cientistas criaram animais que brilham no escuro!

O processo não é doloroso para os animais. Implica apenas a injecção do gene para a produção de GFP em ovos fertilizados... O nível de sucesso é bastante reduzido (menos de 1% de sucesso em 1999), mas ainda assim alguns animais fluorescentes já foram criados. E diga-se de passagem- estes animais são mesmo fixes! A lista de animais fluorescentes inclui ratos, porcos e até um coelhinho verde fluorescente baptizado de Alba! Até existe um macaco parcialmente fluorescente, chamado ANDi.

Mais do que fofinhos, estes animais podem ser úteis no estudo de doenças como Alzheimer’s ou cancro, se a GFP for modificada para ser expressa apenas em determinados tipos de células de interesse. É claro que a baixa percentagem de sucesso e o custo de produção faz com que o seu uso, para além de chamar a atenção dos media, ainda seja reduzido...

Finalmente é preciso dizer que não só animais são capazes de fluorescer hoje em dia. À alguns anos atrás, por exemplo, um grupo de alunos em pos-graduação na universidade Hertfordshire propuseram a criação de uma árvore de natal capaz de brilhar no escuro! Já imaginou? Acabavam-se logo os problemas com luzes de natal fundidas! E com a utilização de novas cores em proteínas fluorescentes descobertas nos últimos anos em vários tipos de coral, a criação de uma árvore de natal multicolorida pode não estar tão longe assim!



sexta-feira, 18 de maio de 2007

Arroz dourado

Plantas geneticamente modificadas (ou GM crops em inglês- genetically modified crops) não são mais do que plantas às quais foi adicionado um ou mais genes específicos, de modo a adquirirem alguma nova característica de interesse.

O potencial destas plantas é bastante vasto- em princípio deveria ser possível retirar qualquer gene de qualquer organismo e introduzi-lo. A sua utilidade é bastante grande, e existem já vários tipos de plantas geneticamente modificados em produção. A maior parte dos 102 millhões de hectares de plantas geneticamente modificadas todos os anos é utilizada para produzir soja com tolerância a herbicidas. Herbicidas, como se sabe, são substâncias químicas utilizadas pelos produtores agrícolas na erradicação de ervas daninhas e espécies vegetais que invadem os campos de cultivo. O problema do uso de herbicidas é que geralmente atacam também a produção, com consequências negativas. De modo a reduzir estes efeitos, foram introduzidas plantas, por exemplo soja, com um gene que lhes permite resistir ao efeito do herbicida- deste modo as plantas infestantes morrem e a soja cresce alegremente.

Outro tipo bastante badalado de plantas geneticamente modificadas é a da produção de espécies resistentes a pestes como insectos. Estas plantas, nomeadamente milho, são chamadas de Bt porque possuem um gene que normalmente se encontra presente num tipo de bactéria chamado Bacillus thurgiensis. Basicamente o milho Bt passa a produzir esta proteína. Quando as larvas destruidoras se alimentam da planta, a proteína torna-se tóxica e causa a sua morte.

Existem mais tipos de plantas geneticamente modificadas, com muitas mais utilidades, e a lista de argumentos a favor e contra o seu uso é extensa. No entanto não é publicidade a nenhuma das estas causas que quero fazer. Mais interessante é falar acerca de um tipo específico de planta geneticamente modificada chamada de ‘arroz dourado’.

Cerca de 3 biliões de pessoas em todo o mundo dependem do arroz como mais importante fonte de alimento. O arroz é uma boa fonte de energia, mas tem algumas deficiências, nomeadamente em vitamina A. Vitamina A é um dos componentes essenciais numa dieta equilibrada. Cerca de 100 a 140 millhões de crianças no mundo apresentam deficiências em vitamina A, causando cegueira a mais de 500,000 por ano, enfraquecendo o sistema imunitário e promovendo outras doenças como diarreia e sarampo. Mais de 1 milhão de mortes por ano estão relacionadas com deficiência de vitamina A.

Que fazer para resolver este problema? Bem, cientistas propuseram-se a criar um tipo de arroz que possuísse β-caroteno, um precursor de vitamina A. Através da introdução de uma enzima presente no milho, outra do narciso e uma terceira de uma bactéria, foi possível criar o chamado ‘arroz dourado’. Esta designação deve-se à sua cor amarelada. De facto, β-caroteno é um componente também presente nas cenouras, dando-lhes a sua característica cor laranja. Curiosamente, segundo o site do Golden Rice Project, as cenouras já foram brancas… tornando-se laranjas através da selecção ao longo de gerações por um jardineiro holandês (visto que a cor da casa real da Holanda é o laranja!).

Claro que a criação de um tipo de planta como este, especialmente se especificamente para países em desenvolvimento, cria algumas questões.

A primeira é obviamente se o arroz dourado possui efectivamente β-caroteno suficiente para satisfazer as nossas necessidades diárias. As primeiras versões de arroz dourado eram efectivamente um pouco inúteis, sendo preciso consumir cerca de 9 kg de arroz por dia! O Golden Rice II, no entanto, é suposto fornecer a dose diária de vitamina A em apenas 70 g de arroz, uma quantidade muito mais lógica!

Outra questão é saber quem é o dono deste produto, e como chega ele àqueles que efectivamente dele precisam. De acordo com o site do Golden Rice Project, os inventores desta planta, Professores Peter Beyer e Ingo Portrykus, assim como a empresa produtora Syngenta doaram o produto para uso em causas humanitárias totalmente de graça… De acordo com este site o objectivo é que num futuro próximo seja possível fazer chegar este novo produto aos pequenos agricultores de países em que o arroz é uma importante parte da dieta, por exemplo à Índia, através de associações humanitárias e dos governos, sem qualquer custos extras…

Bem, talvez a companhia Syngenta tenha mesmo boas intenções (de qualquer forma não existe um mercado para o arroz dourado no mundo desenvolvido, já que o nosso problema é mais excesso de nutrientes do que falta deles). No entanto será preciso assegurar que este produto chega de facto àqueles que dele precisam, e que não seja rejeitado pelas populações, não só devido ao facto de ser um produto trans-génico, mas também devido à sua cor diferente…

De qualquer maneira é preciso admitir que uma tecnologia que não cria vantagens para os grandes produtores, que complementa os tradicionais tipos de produção agrícola, e que é capaz de resolver o problema de deficiência de vitamina A sem requerer outros mecanismos de extracção e tratamento, até que pode ter as suas vantagens…

Mais informações sobre:
arroz dourado
http://www.goldenrice.org/
deficiência de vitamina A (OMS):
http://www.who.int/nutrition/topics/vad/en/index.html

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Diabetes

Diabetes é uma doença importante mas cujas causas e tipos são muitas vezes desconhecidas. O público em geral na maior parte das vezes a única coisa que sabe é que a cura para os diabetes implica injecções de insulina com frequência… e nem essa informação é totalmente correcta!

Pois bem, começando do princípio. Depois de tomarmos uma refeição, os alimentos são digeridos no estômago e intestino, e degradados nos seus componentes mais simples. Esses componentes são absorvidos pela parede do intestino e transportados pelo sangue para o fígado e eventualmente para todas as células do corpo que deles precisam. Desses componentes é preciso realçar a importância da glucose, um simples açúcar que funciona como um dos principais combustíveis do nosso organismo. A sua oxidação é responsável pela produção da maior parte da energia que o nosso organismo utiliza. Para podermos utilizar glucose, as células têm de ser capazes de transportar glucose para o seu interior e activar os respectivos mecanismos internos. Na ajuda desse processo existe uma hormona chamada insulina que têm um papel essencial. A insulina é uma hormona produzida no pâncreas num conjunto de células chamadas células Beta. Estas células produzem insulina em resposta aos níveis de glucose no sangue. Assim, se depois de uma refeição rica em açúcares o nível de glucose no sangue é bastante elevado, o nível de insulina libertado aumenta também, facilitando a internalização de glucose pelas células e a sua utilização. Deste modo a quantidade de glucose decresce e ao fim de 2 horas já regressou aos seus níveis normais.

Os diabetes desenvolvem-se quando existem problemas neste sistema de regulação, de tal modo que os níveis de glucose no sangue são excessivamente altos. Numa pessoa normal os níveis de glucose são geralmente de 5 mMoles, chegando a atingir à volta de 8mMol após uma refeição. Num diabético, os níveis de glucose são sempre acima dos 10-13 mMol, e mantém-se muito acima deste valor várias horas após uma refeição. O valor de glucose de um diabético no sangue pode chegar aos 30 mMol.

No entanto existem dois tipos de diabetes. Os diabetes de tipo 1 são talvez os mais conhecidos. Este tipo de diabete é caracterizado por se manifestar geralmente em crianças e jovens. O problema neste caso é a inexistência de insulina no sangue. As células Beta do pâncreas, por alguma razão, muitas vezes genética, são incapazes de produzir insulina, pelo que a glucose no sangue é incapaz de entrar nas células que dela precisam. É por isso que o diabetes é muitas vezes descrita como uma situação de fome no meio da abundância- o açúcar que as células precisam está no sangue, disponível. Ainda assim as células sofrem e morrem porque não conseguem ter acesso a essa fonte de energia. Por isso, alguns dos sintomas característicos de diabetes de tipo 1 são a fome excessiva, rápida perda de peso e fadiga. Outros sintomas incluem excessiva excreção de urina, sede e mudanças de visão. Este tipo de diabetes é controlável através de injecções controladas de insulina com frequência e uma dieta pobre em açúcar. Não se deve no entanto pensar que diabéticos são o equivalente a consumidores de droga, toxicodependentes de insulina! A insulina não cria habituação- os diabéticos estão dependentes da insulina apenas porque é literalmente essencial à sua sobrevivência!

Os diabetes de tipo 2 manifestam-se geralmente mais tarde, ainda que com o aumento da obesidade e de problemas alimentares tem sido diagnosticada cada vez mais cedo. Os diabetes de tipo 2 são o tipo mais comum de diabetes, compreendendo cerca de 90% de todos os casos de diabetes. Os sintomas são semelhantes aos de diabetes de tipo 1, mas geralmente mais leves, de tal modo que se a doença for detectada cedo é possível reverter o processo. No entanto, a situação metabólica nos diabetes de tipo 2 são ligeiramente diferentes- as células do pâncreas continuam a produzir insulina, mas as células do corpo simplesmente não respondem à insulina, de tal modo que mesmo com insulina presente já não são capazes de internalizar a glucose ou activar os processos para a sua utilização. Uma das explicações para essa des-sensitização pode estar no facto de uma dieta muito rica em açúcar fazer com que hajam picos de libertação de insulina com demasiada influência.

A diabetes do tipo 2 pode ser controlada de modo mais simples do que diabetes 1. Desde que o diabético altere a sua dieta radicalmente de acordo com as instruções do médico e pratique exercício, situações problemáticas podem ser evitadas.


Não se pense, no entanto, que os diabetes são uma doença menor. As consequências de diabetes não tratadas incluem cegueira, danificação dos nervos, redução da circulação sanguínea, o que pode levar a úlceras nos pés, e mesmo amputação de membros, problemas renais (10-20% dos diabetes morre porque os rins deixam de funcionar). 50% dos diabéticos morre ainda de ataques de coração ou de problemas associados a este órgão. Em geral, o risco de morrer é em média duas vezes maior num diabético no que num indivíduo saudável.

Mas que podemos nós fazer para evitar esta doença? Para evitar diabetes de tipo 1 talvez não seja assim tão fácil, já que tende a surgir de repente, e as vezes causado por exemplo por infecções virais. Diabetes 2, no entanto, a forma mais comum da doença é evitável através de uma alimentação saudável e de exercício físico. Por outro lado, uma simples picada no dedo após uma noite sem comer é o suficiente para testar a doença.

Tendo em conta que a Organização mundial de saúde estima que cerca de mais de 1 milhão de pessoas morreram em 2005 de diabetes, uma pequena mudança de dieta e exercício valem a pena…
Mais informações sobre diabetes:
Associação Protectora dos Diabéticos http://www.apdp.pt/default.asp (em português)

Antibióticos super-resistentes...


domingo, 13 de maio de 2007

Menopausa e a importância das avós...



A menopausa, mais do que um período complicado na vida de uma mulher é também um enigma evolucionário… de um ponto de vista evolutivo é geralmente esperado que uma determinada característica evolua se contribuir de algum modo para o sucesso reprodutivo ou sobrevivência do indivíduo. E isto por causa da ‘teoria do gene’ sobre a qual já falámos anteriormente. Se um gene contribui para um maior número de filhos então garante uma maior numero de cópias na geração seguinte, e consequentemente mais indivíduos com essa característica… Portanto se observamos alguma característica presente numa espécie, é normal que tentemos perceber de que modo essa característica contribuiu ao longo da evolução para uma maior sobrevivência ou número de filhos. Mas como explicar então algo como a menopausa? A menopausa é por definição um período a partir do qual a mulher deixa de ser menstruada e é portanto incapaz de produzir mais filhos. Até aqui tudo bem. Tendo em conta que o número total de óocitos é determinado e produzido antes do nascimento é normal que a um determinado ponto uma mulher se torne infértil (por oposição aos homens, que produzem esperma ao longo de toda a vida). A menopausa também ocorre noutros animais, de um modo mais abrupto ou gradual. No entanto, apenas em humanos e baleias e outros cetáceos a menopausa ocorre quando existe ainda em média 1/3 de vida para viver.

Como explicar então que a menopausa ocorra quando ainda existe 1/3 de vida que poderia ser ‘utilizado’ na produção de mais filhos? Talvez seja importante aqui fazer um aparte: não estou a tentar dizer que o objectivo da vida de uma mulher é produzir mais e mais filhos, mas é óbvio que na natureza (viva e não viva, e aqui refiro-me aos vírus) o sistema está organizado para sobreviver e reproduzir. Se a nossa recente história enquanto espécie alterou as regras um pouco isso é outra história. É um facto, no entanto, que as mesmas regras se aplicaram ao longo da nossa evolução…

Mas voltando à menopausa. A menopausa ocorre, a mulher vive mais 1/3 da sua vida e não produz mais filhos… Isto pode significar duas coisas: ou a menopausa ocorre demasiado cedo, ou somos nós que vivemos mais tempo do que seria suposto depois da menopausa ocorrer. É pouco provável que a menopausa esteja a ocorrer demasiado cedo, pois a evolução poderia simplesmente ter aumentado o número de óocitos fazendo com que a menopausa ocorresse mais tarde na vida de uma mulher. É mais provável que a menopausa ocorra porque é de algum modo vantajosa… de facto, a gravidez e nascimento são processos custosos e um investimento numa vida mais longa tem óbvias consequências em termos de quanto pode ser investido na sua própria reprodução. No entanto só porque uma mulher não pode ter filhos não significa que não possa contribuir para a transmissão dos seus genes! É aqui que entra a chamada ‘Grandmother hypothesis’, ou a hipótese da avó. Basicamente as avós são capazes de aumentar a sua contribuição genética para as gerações futuras cuidando dos netos, já que estes partilham pelo em média ¼ dos seus genes. Essa ajuda poderia ser dada através do cuidado directo das crianças ou pela recolha de alimentos ou mesmo auxílio nas árduas tarefas domésticas, dando mais tempo livre às mães…

E isto não é uma situação que tenha ocorrido no passado e seja obsoleta agora. Um recente estudo em populações canadianas e finlandesas têm mostrado que uma avó vivendo perto ou na casa das suas filhas tem um efeito positivo no número de netos que sobrevive até uma idade independente.
Note-se, no entanto, que é apenas referido o efeito positivo das avós no esforço reprodutivo das suas filhas… Mas não poderiam as avós ajudar filhas e filhos? Alguns autores sugerem que tal talvez não fosse favorecido ao longo da evolução devido ao facto de uma avó nunca poder ter a certeza completa que os netos são realmente seus (afinal as noras nem sempre são fiéis aos seus maridos). E isto de facto observa-se em populações reais. Num estudo realizado na Etiópia cientistas observara, que as avós mais facilmente deixavam a sua aldeia para visitar e ajudar uma filha do que um filho…

Enfim, isto pode levar algumas mães a pensar duas vezes antes de decidir morar longe da sua mãe…


The two original papers:
- Gibson M., Mace R. (2005). Helpful grandmothers in rural Ethiopia: A study of the effects of kin on child survival and growth, Evolution and Human Behavior, 26. pp 469-482
- Lahdenperä M., Lummaa V., Helle S., Tremblay M., Russel A. (2004). Fitness benefits of prolonged post-reproductive lifespan in women, Nature, 428 (6979). pp 178-181

sexta-feira, 4 de maio de 2007

A Varíola e Catarina da Rússia


A varíola é uma doença causada por um virus que muitas vezes no passado foi confundido com a varicela devido à semelhança de sintomas. A varíola começa com sintomas semelhantes aos da gripe. Dois ou três dias mais tarde a febre decresce e o paciente sente-se melhor, mas as postulas caracteristicas da doenca comecam a aparecer...

Desde a sua origem, provavelmente à cerca de 3,000 anos na região do Egipto ou India, até 1980 quando foi considerada erradicada, a variola foi uma das mais devastadoras doenças, e repetidas epidemias foram responsáveis pela morte de populações inteiras... De facto, em algumas antigas culturas o efeito devastador da varíola, principalmente em crianças, fez com que nenhum recém nascido com a doenca pudesse ser registado e um nome atribuído até que provasse ser capaz de sobreviver...

E não era uma doença que afectasse apenas os pobres e desfavorecidos. A varíola foi responsável pela morte de importantes personalidades, incluindo a rainha Maria II de Inglaterra, o Czar Pedro II da Russia e o rei Luis XV de Franca...
E quando a doençaa não causava a morte dos pacientes podia ter outras consequências negativas, a mais importante das quais a cegueira...

É pois normal que alguém tão importante como a Imperatriz Catarina da Rússia se preocupasse com a doença, não só em termos da sua saúde e da do seu filho, como a da populacao da Rússia, onde uma recente epidemia havia morto 20,000 russos na Sibéria. E de qualquer forma uma das suas ambições era a modernização da medicina russa, e uma doença que causava 1 em cada 10 mortes no continente europeu era um bom começo. O problema é que a medicina moderna no país era praticamente inexistente. Solução? Obter ajuda de Inglaterra, onde a inoculação do vírus, em prática desde 1720 com grande sucesso, e com uma fatalidade de apenas 1%...

O médico chamado à Russia era o Dr.Dimsdale, um dos mais bem sucedidos e ricos inoculadores do pais, e que portanto não precisava de dinheiro, nem sucesso, e muito menos de complicações como uma viagem horrorosa ao longo do continente até São Petesburgo.

Os russos conseguiram, no entanto, ser bastante persuasivos, especialmente monetáriamente, e portanto a 28 de Julho de 1768 Dismdale e o seu filho partiram para a Rússia, apenas para descobrir a chegada que a sua tarefa essencial era a inoculação da Imperatriz e do seu filho primogénito. Uma notícia como esta poderia ter assustado de morte qualquer médico... Afinal, quais as consequências se as coisas corressem mal? E isto num país em que inoculação era considerada algo demoníaco, e em que se acreditava que os pacientes dos quais a substância a inocular era removida morriam com toda a certeza...

Bem, Dimsdale não deixou as coisas ao acaso... Em primeiro lugar testou a inoculação em menos reais vítimas. Estas tentativas tiveram resultados desanimadores. Basicamente ninguém desenvolvia as postulas características da doença (sinal de que o organismo estava a reagir ao virus e a desenvolver defesas).

Mas a imperatriz não se deixou demover, e a um domingo, 12 de Outubro, foi inoculada... numa semana a imperatriz havia desenvolvido as características postulas e a 28 de Outubro estava totalmente recuperada e de volta a corte. Apesar da sua confianca no sucesso da inoculação, Dimsdale não deixou as coisas ao acaso, e diz-se que no dia da operação tinha uma carruagem e cavalos prontos, só para o caso de as coisas correrem mal e uma saida apressada ser necessária...

Mas felizmente tudo correu bem, e inoculações foram feitas por toda a Rússia com grande sucesso. E as coisas também resultaram bem para o Dr Dismdale, que acabou com um título de barao, 10,000 libras de pagamento e um lugar de honra na história da Rússia. O agora barão Dismdale voltou a Inglaterra ainda mais célebre do que antes, e tão rico que deixou a medicina e decidiu abrir um banco...

Finalmente, e para terminar, e interessante notar que a história recente do combate a variola é também caracterizada por bons resultados.Na verdade a varíola é um dos (poucos) casos de sucesso da Organização mundial de saude em termos de erradicação de doenças infecciosas. De facto, a OMS foi capaz de erradicar a varíola em mais ou menos uma década e a doença foi dada como ‘extinta’ em 1980.... de tal modo que a nova geração nem recebeu a vacina para a doença, com consequências óbvias em termos de potencial para ataques terroristas.... mas isso é outra história!

Baseado em ‘From Rússia with trepidation’, New Scientist de 24 de Março

Mais informação sobre a varíola no site da OMS (in english)
http://www.who.int/mediacentre/factsheets/smallpox/en/

quinta-feira, 3 de maio de 2007

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Determinação do sexo...

A determinação do sexo na espécie humana é bastante… aborrecida. O sistema é simples: espermatozóides podem ter um cromossoma X ou um cromosoma Y, enquanto que os óvulos apenas cromosomas X. Se o bebé for XX, será uma rapariga, se for XY um rapaz… sem dúvidas e sem possibilidade de troca (fora alguns conhecidos, mas raros, síndromes). A determinação do sexo pelos cromossomas não é específica dos humanos. Muitos usam o mesmo sistema. As galinhas e outros pássaros tem um sistema um pouco diferente – os machos são ZZ e as fêmeas ZW.

O mais interessante é que em alguns animais não são os cromossomas que definem o sexo dos filhos… mas o ambiente. O exemplo mais conhecido é o de muitos répteis, em que a temperatura dos ovos tem um papel determinante. Por exemplo, em algumas tartarugas, se a temperatura dos ovos for acima dos 29º, nascem fêmeas, se for abaixo são machos. Noutros casos, como em alguns crocodilos, uma temperatura intermédia leva a nascerem machos, e temperaturas mais baixas ou mais altas levam a fêmeas. Este sistema é muito prático, pois ajuda a regular a proporção de machos e fêmeas numa população. Claro que aqui vemos já um dos problemas do aquecimento global. A subida de um grau pode ser o suficiente para produzir excesso de um certo sexo…

Mas existem situações ainda mais interessantes… As lagartas marinhas Bonellia viridis, antes de se tornarem adultas, apresentam um fase intermédia, sob a forma de larva. As larvas não têm sexo definido. Na altura de se tornarem adultos, no entanto, tudo depende de quem se encontrar por perto. Na presença de muitas fêmeas diferenciam-se em machos. Se não, transformam-se elas mesmo em fêmeas.

E agora o meu caso favorito- existe uma espécie de peixe dos recifes de coral, Halichoeres melanurus, em que cada macho tende a controlar um harém de fêmeas. Uma experiência realizada em 1994 teve resultados muito curiosos- a um harém de fêmeas foi retirado o macho dominante… qual não foi a surpresa ao verificar que ao fim de 2 a 3 semanas, a maior das fêmeas se havia transformado… num macho. E como se isso não bastasse, quando o macho foi reintroduzido, a fêmea-agora-macho voltou a ser fêmea…

E vai uma pessoa pensar que mudanças de sexo eram uma coisa nova…

Calvin and Hobbes...