sexta-feira, 18 de maio de 2007

Arroz dourado

Plantas geneticamente modificadas (ou GM crops em inglês- genetically modified crops) não são mais do que plantas às quais foi adicionado um ou mais genes específicos, de modo a adquirirem alguma nova característica de interesse.

O potencial destas plantas é bastante vasto- em princípio deveria ser possível retirar qualquer gene de qualquer organismo e introduzi-lo. A sua utilidade é bastante grande, e existem já vários tipos de plantas geneticamente modificados em produção. A maior parte dos 102 millhões de hectares de plantas geneticamente modificadas todos os anos é utilizada para produzir soja com tolerância a herbicidas. Herbicidas, como se sabe, são substâncias químicas utilizadas pelos produtores agrícolas na erradicação de ervas daninhas e espécies vegetais que invadem os campos de cultivo. O problema do uso de herbicidas é que geralmente atacam também a produção, com consequências negativas. De modo a reduzir estes efeitos, foram introduzidas plantas, por exemplo soja, com um gene que lhes permite resistir ao efeito do herbicida- deste modo as plantas infestantes morrem e a soja cresce alegremente.

Outro tipo bastante badalado de plantas geneticamente modificadas é a da produção de espécies resistentes a pestes como insectos. Estas plantas, nomeadamente milho, são chamadas de Bt porque possuem um gene que normalmente se encontra presente num tipo de bactéria chamado Bacillus thurgiensis. Basicamente o milho Bt passa a produzir esta proteína. Quando as larvas destruidoras se alimentam da planta, a proteína torna-se tóxica e causa a sua morte.

Existem mais tipos de plantas geneticamente modificadas, com muitas mais utilidades, e a lista de argumentos a favor e contra o seu uso é extensa. No entanto não é publicidade a nenhuma das estas causas que quero fazer. Mais interessante é falar acerca de um tipo específico de planta geneticamente modificada chamada de ‘arroz dourado’.

Cerca de 3 biliões de pessoas em todo o mundo dependem do arroz como mais importante fonte de alimento. O arroz é uma boa fonte de energia, mas tem algumas deficiências, nomeadamente em vitamina A. Vitamina A é um dos componentes essenciais numa dieta equilibrada. Cerca de 100 a 140 millhões de crianças no mundo apresentam deficiências em vitamina A, causando cegueira a mais de 500,000 por ano, enfraquecendo o sistema imunitário e promovendo outras doenças como diarreia e sarampo. Mais de 1 milhão de mortes por ano estão relacionadas com deficiência de vitamina A.

Que fazer para resolver este problema? Bem, cientistas propuseram-se a criar um tipo de arroz que possuísse β-caroteno, um precursor de vitamina A. Através da introdução de uma enzima presente no milho, outra do narciso e uma terceira de uma bactéria, foi possível criar o chamado ‘arroz dourado’. Esta designação deve-se à sua cor amarelada. De facto, β-caroteno é um componente também presente nas cenouras, dando-lhes a sua característica cor laranja. Curiosamente, segundo o site do Golden Rice Project, as cenouras já foram brancas… tornando-se laranjas através da selecção ao longo de gerações por um jardineiro holandês (visto que a cor da casa real da Holanda é o laranja!).

Claro que a criação de um tipo de planta como este, especialmente se especificamente para países em desenvolvimento, cria algumas questões.

A primeira é obviamente se o arroz dourado possui efectivamente β-caroteno suficiente para satisfazer as nossas necessidades diárias. As primeiras versões de arroz dourado eram efectivamente um pouco inúteis, sendo preciso consumir cerca de 9 kg de arroz por dia! O Golden Rice II, no entanto, é suposto fornecer a dose diária de vitamina A em apenas 70 g de arroz, uma quantidade muito mais lógica!

Outra questão é saber quem é o dono deste produto, e como chega ele àqueles que efectivamente dele precisam. De acordo com o site do Golden Rice Project, os inventores desta planta, Professores Peter Beyer e Ingo Portrykus, assim como a empresa produtora Syngenta doaram o produto para uso em causas humanitárias totalmente de graça… De acordo com este site o objectivo é que num futuro próximo seja possível fazer chegar este novo produto aos pequenos agricultores de países em que o arroz é uma importante parte da dieta, por exemplo à Índia, através de associações humanitárias e dos governos, sem qualquer custos extras…

Bem, talvez a companhia Syngenta tenha mesmo boas intenções (de qualquer forma não existe um mercado para o arroz dourado no mundo desenvolvido, já que o nosso problema é mais excesso de nutrientes do que falta deles). No entanto será preciso assegurar que este produto chega de facto àqueles que dele precisam, e que não seja rejeitado pelas populações, não só devido ao facto de ser um produto trans-génico, mas também devido à sua cor diferente…

De qualquer maneira é preciso admitir que uma tecnologia que não cria vantagens para os grandes produtores, que complementa os tradicionais tipos de produção agrícola, e que é capaz de resolver o problema de deficiência de vitamina A sem requerer outros mecanismos de extracção e tratamento, até que pode ter as suas vantagens…

Mais informações sobre:
arroz dourado
http://www.goldenrice.org/
deficiência de vitamina A (OMS):
http://www.who.int/nutrition/topics/vad/en/index.html

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