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quarta-feira, 23 de maio de 2007

Animais fluorescentes? usando GFP


O interesse pela fluorescência não é exclusivo de criancas ou daqueles com uma mente mais inventiva. Mais do que um brinquedo, a fluorescência pode ser de grande utilidade para a ciência.

De facto, uma das ferramentas científicas mais úteis desenvolvidas nos ultimos anos foi a chamada GFP (green fluorescent protein) ou em português, a proteína verde fluorescente.

A história da GFP começou em 1961 quando os cientistas Osamu Shimomura and Frank Johnson trabalhavam na alforreca Aequorea victoria. Basicamente estes dois cientistas descobriram que existia uma proteína nesta alforreca que utilizava sinais luminosos dependentes em cálcio na produção da cor verde fluorescente característica da espécie. Para além de fazer as alforrecas brilhar com uma cor engraçada, a utilidade imediata desta proteína não foi imediatamente compreendida. Foi só bastante mais tarde, após 1992, que a GFP começou a ter uma função essencial em ciência...

A GFP é utilizada em ciência basicamente para indicar se um gene introduzido num organismo foi transferido para o núcleo da nova célula e está a ser expresso normalmente. Vejamos: Como vimos na semana passada, no programa sobre plantas transgénicas, muitas vezes os cientistas estão interessados em introduzir genes em novas células ou organismos. Mas como saber se o novo gene foi introduzido correctamente, e que a proteína correspondente esta a ser produzida? Bem basicamente os cientistas introduzem o gene de interesse e o gene de GFP. Se o gene de interesse tiver sido introduzido com sucesso, então também GFP será introduzido com sucesso, e as células ou organismo de introdução irá apresentar uma característica cor verde fluorescente...

E não só! É também possível associar a nossa proteína de interesse com GFP e monitorizar o seu movimento dentro de uma célula viva!

E a grande vantagem da GFP é que não só é fluorescente e pequena, como não possui quaisquer efeitos negativos na célula de introdução...


Mas agora passando a questões mais interessantes... Será que é possível utilizar GFP na criação de algo mais interessante, para além das suas óbvias vantagens para cientistas e investigadores?

Bem, acontece que já alguém teve ideias semelhantes. Desde que a GFP comecou a ser utilizada rutineiramente em ciencia que uma lista interessante de organismos fluorescentes tem sido criada... ou dizendo de outra maneira, os cientistas criaram animais que brilham no escuro!

O processo não é doloroso para os animais. Implica apenas a injecção do gene para a produção de GFP em ovos fertilizados... O nível de sucesso é bastante reduzido (menos de 1% de sucesso em 1999), mas ainda assim alguns animais fluorescentes já foram criados. E diga-se de passagem- estes animais são mesmo fixes! A lista de animais fluorescentes inclui ratos, porcos e até um coelhinho verde fluorescente baptizado de Alba! Até existe um macaco parcialmente fluorescente, chamado ANDi.

Mais do que fofinhos, estes animais podem ser úteis no estudo de doenças como Alzheimer’s ou cancro, se a GFP for modificada para ser expressa apenas em determinados tipos de células de interesse. É claro que a baixa percentagem de sucesso e o custo de produção faz com que o seu uso, para além de chamar a atenção dos media, ainda seja reduzido...

Finalmente é preciso dizer que não só animais são capazes de fluorescer hoje em dia. À alguns anos atrás, por exemplo, um grupo de alunos em pos-graduação na universidade Hertfordshire propuseram a criação de uma árvore de natal capaz de brilhar no escuro! Já imaginou? Acabavam-se logo os problemas com luzes de natal fundidas! E com a utilização de novas cores em proteínas fluorescentes descobertas nos últimos anos em vários tipos de coral, a criação de uma árvore de natal multicolorida pode não estar tão longe assim!



quarta-feira, 2 de maio de 2007

Determinação do sexo...

A determinação do sexo na espécie humana é bastante… aborrecida. O sistema é simples: espermatozóides podem ter um cromossoma X ou um cromosoma Y, enquanto que os óvulos apenas cromosomas X. Se o bebé for XX, será uma rapariga, se for XY um rapaz… sem dúvidas e sem possibilidade de troca (fora alguns conhecidos, mas raros, síndromes). A determinação do sexo pelos cromossomas não é específica dos humanos. Muitos usam o mesmo sistema. As galinhas e outros pássaros tem um sistema um pouco diferente – os machos são ZZ e as fêmeas ZW.

O mais interessante é que em alguns animais não são os cromossomas que definem o sexo dos filhos… mas o ambiente. O exemplo mais conhecido é o de muitos répteis, em que a temperatura dos ovos tem um papel determinante. Por exemplo, em algumas tartarugas, se a temperatura dos ovos for acima dos 29º, nascem fêmeas, se for abaixo são machos. Noutros casos, como em alguns crocodilos, uma temperatura intermédia leva a nascerem machos, e temperaturas mais baixas ou mais altas levam a fêmeas. Este sistema é muito prático, pois ajuda a regular a proporção de machos e fêmeas numa população. Claro que aqui vemos já um dos problemas do aquecimento global. A subida de um grau pode ser o suficiente para produzir excesso de um certo sexo…

Mas existem situações ainda mais interessantes… As lagartas marinhas Bonellia viridis, antes de se tornarem adultas, apresentam um fase intermédia, sob a forma de larva. As larvas não têm sexo definido. Na altura de se tornarem adultos, no entanto, tudo depende de quem se encontrar por perto. Na presença de muitas fêmeas diferenciam-se em machos. Se não, transformam-se elas mesmo em fêmeas.

E agora o meu caso favorito- existe uma espécie de peixe dos recifes de coral, Halichoeres melanurus, em que cada macho tende a controlar um harém de fêmeas. Uma experiência realizada em 1994 teve resultados muito curiosos- a um harém de fêmeas foi retirado o macho dominante… qual não foi a surpresa ao verificar que ao fim de 2 a 3 semanas, a maior das fêmeas se havia transformado… num macho. E como se isso não bastasse, quando o macho foi reintroduzido, a fêmea-agora-macho voltou a ser fêmea…

E vai uma pessoa pensar que mudanças de sexo eram uma coisa nova…

sexta-feira, 27 de abril de 2007

Sistema de orientação dos morcegos

Acabei à pouco tempo de ler ‘Drácula’, de Bram Stocker, o que inevitavelmente me fez sonhar algumas noites com morcegos… daqueles que chupam sangue. Claro que existem nesta história várias coisas a clarificar. Em primeiro lugar os famosos morcegos chupadoresde sangue na verdade não chupam sangue nenhum. De um modo ágil e leve são capazes de se alimentar do sangue de vacas, cavalos, porcos e aves, e até ocasionalmente humanos, sem danificar a chamaremos vítima de modo excepcional. Simplesmente causam uma pequena picada com os dentes e removem algum sangue com a língua. Fazem-no de modo tão singelo que um animal pode chegar a passar 30 minutos sem se aperceber que tem um morcego a alimentar-se do seu sangue!

No entanto, hoje não vamos falar de morcegos vampiros. Para além destes existem muitos outros tipos de morcegos com dietas bem diferentes. Existem, por exemplo, morcegos que se alimentam de fruta. Hoje especificamente estes morcegos não nos interessam. Como se alimentam de fruta, caracterizada pelas suas cores atractivas, estes morcegos usam uma visão normal quando procuram comida. Bem mais interessantes são os morcegos insectívoros, ou seja, morcegos que se alimentam de insectos. A característica interessante destes morcegos é a de possuírem um sonar, que lhes permite alimentarem-se de insectos activos apenas à noite. Alimentarem-se de tais insectos é muito bom, pois raros são os outros predadores capazes de explorar estas presas.

O sistema sonar dos morcegos insectívoros é extremamente interessante, especialmente porque pode até parecer que os morcegos sabem engenharia! Por isso o Biocuriosidades de hoje vai falar sobre o sistema de comunicação dos morcegos insectívoros!

De modo a tornar a explicação mais interessante, vou apresentar um conjunto de 4 problemas que os morcegos têm de resolver de modo a serem capazes de caçar à noite. E para cada problema irei apresentar a solução que um engenheiro daria, e a solução que a evolução dos morcegos ao longo de milhar de anos desenvolveu!

O primeiro problema é obviamente a falta de luz. Um engenheiro pode sugerir 3 soluções: produzir luz, caçar de dia (o que não é uma opção para o morcego, já que os insectos de que se alimenta estão disponíveis à noite apenas) ou usar um radar, ou seja, um sistema de navegação alternativo à visão. Os morcegos ficaram-se pela última opção e usam um sistema de radar que é único em animais terrestres (ainda que comum em animais aquáticos como as baleias).

Portanto os morcegos usam ondas sonoras para se orientarem- soltam digamos que um grito e esperam pelo eco para lhes dar informação do que se passa à sua volta. Um important factor é saber a frequência desses sons. O nosso engenheiro sugere uma frequência alta de modo a obter eco de qualidade. O nosso morcego segue a sugestão. Os morcegos emitem sons com uma frequência de 20 000 Hz ou mais. Isto porque a maior parte dos sons no mundo à nossa volta têm uma frequência inferior a 20 000 Hz. Por isso, basicamente, os morcegos vivem num mundo de silêncio excepto para os sons emitidos por si mesmo. Para além disso, cada espécie de morcego irá emitir sons numa frequência característica, de modo a diminuir confusões geradas pelas emissões de outros tipos de morcegos. Esta característica é extremamente útil na identificação de espécies.

A questão seguinte é saber quantas vezes emitir esses sons por cada unidade de tempo. O engenheiro argumenta e muito bem que quanto maior a frequência maior a quantidade de informação obtida sobre o meio. No entanto, a quantidade de energia usada é também maior. Os morcegos resolvem o problema de maneira engenhosa: quando estão simplesmente a movimentar-se e a obter uma visão geral do mundo, emitem sons a cerca de 10 emissões por segundo. Quando estão no acto de caçar, no entanto, as emissões sobem para 200 emissões por segundo, garantindo uma visão detalhada essencial para a captura da presa.

E qual a intensidade do som? O som tem de ser obviamente bastante alto, já que o eco tende a ser 2000 vezes mais fraco do que o som original. Para além disso os morcegos têm ouvidos muito sensíveis, de modo a detectar mesmo os ecos mais fracos. No entanto isto apresenta obviamente um problema- os sons muito altos emitidos podem danificar os ouvidos ultrasensíveis. Um engenheiro sugeriria que o receptor fosse desligado antes do som ser emitido, e é isso que os morcegos fazem. Quando os sons são emitidos, os ouvidos dos morcegos tornam-se menos sensíveis pela contracção automática de um músculo específico no ouvido do morcego.

Mas tudo isto não explica o modo como os morcegos conseguem obter informação acerca do que se passa à sua volta apenas a partir apenas do eco. Na verdade, os morcegos exploram essas ondas sonoras ao máximo. De modo a retirar tanta informação quanto possível. O intervalo de tempo entre a emissão do som e a chegada do eco, por exemplo, informa sobre a distância entre o morcego e a sua presa. O ângulo de chegada do som, por outro lado, é capaz de indicar o tamanho do insecto a ser caçado. Os morcegos utilizam também a diferença de tempo entre a chegada do som a um ouvido e a outro como uma indicação da direcção da presa. Finalmente, a interferência entre o eco no topo e no fundo das orelhas (caracteristicamente longas no caso dos morcegos) pode fornecer informação sobre a elevação relativa entre presa e predador.

Baseado no capítulo 2 ('Good design') do livro 'The Blind Watchmaker' de Richard Dawkins

Pássaros que gritam lobo

Existe uma ideia generalizada de que o Homem e o unico animal realmente vil… afinal, pensamos nós, somos os únicos capazes de nos enganar uns aos outros... Quero dizer, nenhum animal é capaz de mentir, não é?

Acontece que a mentira é mais generalizada no reino animal do que pensamos. Aqui vai um exemplo curioso: Todos nos conhecemos a história de João e o Lobo. João era um pastorzinho que nas horas vagas se divertia a assustar os habitantes da sua aldeia, gritando que um lobo lhe atacava o rebanho... quando na verdade tudo estava bem. Uma daquelas mentirazinhas tipicamente humanas, não é? Bem, por mais incrível que pareça, é exactamente isso que fazem duas espécies de pássaros (Thamnomanes schystogynus e Lanio versicolor).

Estas curiosas aves vivem em bandos com outras espécies de pássaros. No entanto, dentro do bando as diferentes especies têm diferentes funções: As cacadoras, que se ocupam da caça de insectos, e estas duas espécies, que funcionam como sentinelas. A sua função é simples: verificar constantemente se algum predador, tal como um falcão, se aproxima. Se tal acontece, as sentinelas lançam um grito de alerta, e todas as aves do bando procuram refúgio. No entanto as sentinelas, de vigia, não podem passar o tempo a cacar. Que fazer, então, quando uma das aves caçadoras voa por perto perseguindo um delicioso insecto? A resposta é bastante óbvia. A sentinela simplesmente lança o grito de alerta, fazendo com que a cacadora fuga. Assim, a costa fica livre para capturar o insecto. Em suma, as sentinelas gritam lobo. Aqui, no entanto, cessa a comparacao com a história do Joao. A história do pastor teve um final infeliz- eventualmente um lobo atacou realmente as ovelhas, e os habitantes da aldeia, fartos de serem enganados, ignoram os genuínos gritos de socorro. A história das sentinelas tem um final mais feliz, já que as cacadoras geralmente não ignoram os gritos de alerta. Porquê? Apesar de parecer muito esperto ignorar um grito de alerta, muitas vezes o risco de o fazer é simplesmente muito alto... Uma caçadora concentrada na caça, não sabe se existe realmente um falcão por perto... e ignorar um alerta verdadeiro pode significar a morte a maior parte das vezes. O custo de se esconder é apenas perder um insecto... e de qualquer forma há bastantes por perto. Para além disso, as cacadoras também não são tolas. Quando uma caçadora se encontra em espaco aberto, onde ela própria tem acesso a todo o espaço visual, só foge quando vê ela própria um predador... É tudo uma questão de pesar os riscos e as vantagens… e escolher o que é mais vantajoso. O mesmo acontece com outros animais ditos mentirosos- nem sempre mentir ou recusar a mentira é vantajoso. Assim parece que para além de mentir, os animais também percebem de economia...
Baseado em Munn, C. (1986). Birds that ‘cry wolf’, Nature, 319 (9). Pp143- 145